quinta-feira, 27 de novembro de 2014

FUVEST 2016: pequenas observações

No próximo domingo será realizada a prova da FUVEST, um dos vestibulares mais importantes do país. Aquele que vai prestá-la precisa entender que, pelo menos em Português, nos últimos anos essa avaliação tem-se mostrado sem sustos, artimanhas, mistérios ou segredos. Sua intenção não é descobrir entre os estudantes potenciais filólogos, linguistas, gramáticos ou literatos, mas apenas selecionar quem tem competência linguística adequada para as diversas carreiras do ensino superior, não importa se de humanas, biológicas ou exatas.
Dessa forma, por exemplo, as questões de literatura não vão se concentrar em literatices sobre quem escreveu tal livro ou qual o nome de tal período estético. O que se cobrará é o reconhecimento dos mecanismos de funcionamento do texto literário. Assim, pode-se indagar o que a repetição de um evento (consoante, rima, vocábulo, ação, o que quer que seja) tem a ver com a dinâmica da obra em análise.
Nesse ponto, há algo que ressaltar. Já que todo texto literário é um produto social, pode-se cobrar do vestibulando o reconhecimento da relação que um romance ou um poema tem com o seu momento histórico. Assim, o banditismo de Jão Fera em Til é um típico sinal de que a região em que ele se encontra, o interior de São Paulo, ainda não havia se civilizado por completo, abrindo caminho para a utilização desses recursos violentos para a manutenção de uma certa ordem.  Ou então, as plantações de Luís Galvão (cana e café) indicam processos econômicos a que o Brasil se havia dedicado. Até mesmo a posição de sua fazenda revela a maneira como essa região se povoou, concentrada inicialmente em atender a zona aurífera de Minas Gerais. Entretanto, não só de História se viverá. É possível fazer uma ponte com Geografia para entender que o tipo de solo que Alencar chama de rico e ferruginoso é nada mais do que a célebre terra roxa.
Além disso, o candidato deve estar preparado para questões que exigirão a comparação entre as nove obras da lista de livros. Assim, deverá captar, por exemplo, que a presença do comerciante italiano em Til e em O Cortiço revela flagrantes da composição de nossa população. Ou então que a escravidão justifica o comportamento cínico de Brás Cubas ou a desvalorização do trabalho rural como se vê em Jão Fera, de Til, e Jerônimo, de O Cortiço. Sem falar que deixa suas feridas em Memórias de um Sargento de Milícias e Sentimento do Mundo. Enfim, serão questões que funcionarão não apenas como verificação de leitura, mas principalmente de compreensão. Nesse ponto, é bastante válido reler os posts dO Magriço Cibernético dedicados a cada um desses livros (21 de janeiro24 de março29 de abril03 de junho17 de junho24 de junho12 de agosto16 de agosto02 de setembro09 de setembro26 de setembro03 de outubro07 de outubro17 de outubro e 28 de outubro).
É também importante lembrar que a FUVEST cobra a compreensão dos mecanismos de funcionamento de uma obra literária e não simplesmente a reprodução de clichês analíticos. Assim, por exemplo, em O Cortiço, obra que todo mundo facilmente associa aos ditames do Naturalismo, pode-se cobrar características comuns ao Romantismo, como a exuberância da natureza brasileira ou a sensualidade feminina associada ao ambiente em que a mulher vive. Ou em Capitães da Areia, há que se lembrar que, apesar de se tratar de um romance do regionalismo modernista, a relação entre Pedro Bala e Dora é uma atualização do Romantismo.
Quanto às questões de interpretação de textos que não fazem parte da lista de obras da FUVEST, o que inclui os literários e os não-literários, o esquema será basicamente o mesmo: o candidato será instado a observar e identificar os mecanismos de funcionamento da linguagem. Assim, será cobrada não só a compreensão do significado de um texto, mas também a busca, por exemplo, de uma palavra que sintetize as ideias apresentadas. Ou então, de uma expressão que as repita em outras palavras. Ou ainda as manifestações dos diferentes níveis de linguagem, principalmente o formal e o coloquial, assim como a transferência de uma frase de um registro para outro. Mas o que se tem mostrado mais interessante é que muitas vezes essa prova exige que o candidato observe um fato apresentado no enunciado para, sem se preocupar em classificá-lo ou rotulá-lo, localizar uma alternativa em que haja uma frase como o mesmo mecanismo linguístico.
Quanto à Gramática, percebe-se que não há mais espaço para filigranas como a cobrança do tipo de sujeito ou oração, ou a identificação da diferença entre um complemento nominal e um adjunto adnominal, entre um predicado verbal e um predicado nominal. As questões têm-se mostrado mais inteligentes, na medida em que mais razoáveis, pois cobram o que é útil para qualquer profissional, não somente para os especialistas em língua. Assim, quando aparecem testes sobre regência, concordância, crase, nota-se que a resposta é obtida sem absurdos conhecimentos gramatiqueiros, mas com um pouco de raciocínio e intelecção textual. No mesmo campo estão questões que pedem para que o candidato indique o valor de uma palavra, principalmente o de um pronome. Alcança a resposta quem compreende o contexto em que ela está inserida. Ou seja, quem sabe ler.
Enfim, é nesse ponto que a FUVEST se tem consagrado como um excelente exame. É uma prova que apenas verifica quem tem competência linguística. Essa habilidade será essencial para quem quiser estudar com eficiência na vida acadêmica. Qualquer que seja a carreira.




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domingo, 2 de novembro de 2014

ENEM 2014 - Algumas Orientações


No próximo final de semana ocorre mais uma edição do ENEM, prova que, apesar dos tropeços dos últimos tempos, conseguiu ganhar importância no universo dos vestibulandos.  Infelizmente, de um valioso termômetro do nível de ensino do País, transformou-se em um gigantesco vestibular, além de ferramenta de marketing de inúmeras utilidades. Entretanto, é mais útil discutir o que o examinando precisa ter em mente neste domingo na prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.
O ENEM avalia competências e habilidades (o que não significa que não tenha vez por outra um lado conteudista). Assim, o que o candidato precisa demonstrar é sua capacidade de leitura e interpretação de diferentes tipos de texto, a matéria-prima da prova. Dessa forma, é importante reconhecer e entender diversas modalidades textuais e captar como elas funcionam socialmente.  Portanto, deve-se entender, por exemplo, que um cartaz apresenta concisão e ligação entre imagem e código verbal em nome da comunicação imediata, ou que um editorial apresenta elementos argumentativos, que uma propaganda tem preocupação em fixar a mensagem na mente no leitor, que uma charge sintetiza em imagem algum tema de clamor social.
Além disso, o candidato deve saber relacionar diversas espécies de texto, verbais ou imagéticos, buscando não apenas semelhanças, mas também diferenças. Ou então reconhecer neles quais são os objetivos do seu autor e a que público se dirige. Num romance de José de Alencar, por exemplo, a descrição idealizada pode servir para revelar que o escritor ou queria sofisticar o seu leitor, ou tinha em mente que quem degustava sua obra era preocupado com ostentação de luxo. Por fim, deve-se também detectar que estratégias um texto possui para influenciar o seu receptor. Basta lembrar que é comum propagandas de cerveja sempre apresentarem gente feliz degustando o produto, dando a entender que se trataria de um vital elixir da bem-aventurança.
No fundo, o que o estudante vai ter de captar são os mecanismos de funcionamento de um texto, perceber que palavras servem para conectar ou retomar ideias, quais termos têm o dom de resumir ou simbolizar pensamentos ou conjunto de valores. Assim, é de vital importância saber detectar a função da linguagem predominante - quando em Memórias Póstumas de Brás Cubas o narrador confessa no primeiro capítulo que por um bom tempo hesitou se começava sua biografia pelo nascimento ou pela morte, ele fez com que a narrativa discorresse sobre ela mesma, o que configura a função metalinguística. Ou então notar como a linguagem pode ser usada para fazer com que o leitor preste atenção à sua construção, configurando a função poética, muito bem vista, por exemplo, no largo emprego de proparoxítonas em "Balada do Mangue", de Vinicius de Moraes, servindo para representar a situação anormal e canhestra de a feminilidade ser usada para prostituição. Além disso, o aluno pode ser instigado a reconhecer a capacidade que os textos têm de preservar nossa identidade e nosso patrimônio cultural. É o que se vê, por exemplo, no poema "Não Sei Dançar", de Manuel Bandeira, ou no romance Amar, Verbo Intransitivo, de Mário Andrade, em que se apresenta o corso: em ambos descreve-se como se festejava o Carnaval em tempos passados.
 
Quadro de Portinari retratando a zona de prostituição do Mangue no Rio de Janeiro.
Ainda nesse escopo, quem vai prestar ENEM precisa levar em consideração que a língua é um instrumento social e, portanto, suscetível a variações ligadas ao contexto em que é utilizada. Logo, não existe um padrão único, mas vários, que são os níveis de linguagem, todos legítimos, cabendo apenas observar em que situações são adequados. Deve-se então aceitar que a publicidade, entre tantos outros gêneros, utiliza linguagem coloquial para garantir maior alcance à sua mensagem. O que não significa que o padrão culto perdeu sua utilidade: há momentos em que ele é vital, como na documentação científica ou na redação de regulamentos.
Com relação ao corpo, não se deve esquecer que ele é capaz de carregar e transmitir significados, promovendo a criação de identidade, a integração social e a satisfação de necessidades cotidianas. Quando se dança, por exemplo, pode haver uma preocupação em seduzir, divertir, assim como quando se pratica esporte pode estar-se buscando conhecer pessoas ou mesmo competir e garantir a primazia dentro de um grupo social. Ou ainda garantir melhor qualidade de vida. Nesse aspecto, há sempre uma questão que apresenta um texto que versa sobre a necessidade de mudança de hábitos corporais em nome da saúde.
O ENEM cobra também a análise da arte em suas múltiplas manifestações, todas  legítimas, não importando se é um quadro de Cézanne, um concerto de Bach, um grafite nos muros de São Paulo ou o funk erotizado e marginal dos morros do Rio de Janeiro ou de ostentação da periferia de São Paulo. Seguindo essa linha, é vital entender que o conceito de beleza, essencial para a manifestação artística, não é universal, pois é um fenômeno cultural e, portanto, relativo: tanto é  bela uma top model como Gisele Bündchen quanto uma miss plus size ou mesmo uma mulher de pescoço de girafa da Tailândia.


Dentro do campo artístico, atenção especial deve ser dada à literatura. É importante perceber que esse tipo de produção está sempre inserido em seu momento e por isso revela características do seu contexto histórico, social e político. Assim, deve-se lembrar, por exemplo, que o Romantismo, surgido 14 anos após a independência do Brasil, acaba naturalmente expressando ideais nacionalistas. Ou que o Primeiro Tempo Modernista, surgido numa época em que a industrialização de São Paulo já se estava mostrando marcante, acabaria tendo tendências futuristas. Mas é também importante notar dentro dos textos literários quais concepções de sua função ou do processo de construção eles apresentam: um romântico acreditaria que sua arte é essencialmente emoção e, se a obra conseguiu tocar o coração do leitor, já cumpriu sua função estética, sem que haja preocupação com a forma, o que é o oposto da visão parnasiana, que põe em primeiro plano o artesanato da palavra, ou do Realismo, que privilegia a crítica social. Além disso, é necessário lembrar que certos temas não se prendem a uma escola literária: a valorização da cultura popular, por exemplo, pode ser vista no Romantismo e no Modernismo, assim como o endeusamento da mulher está presente no Trovadorismo, no Classicismo, no Romantismo e no Modernismo de Vinicius de Moraes.
Ademais, o candidato precisa estar antenado às novas tecnologias, sabendo identificá-las, além de mostrar-se capaz de entender seu funcionamento e o impacto social que elas provocam na comunicação e na difusão de conhecimento. De fato, a internet tem servido para que ideias circulem de maneira espantosa, não apenas nas redes sociais, em que pessoas trocam informações, opiniões e conhecimento, mas também em comunicadores instantâneos (as chamadas mídias síncronas) ou e-mail e fóruns (as chamadas mídias assíncronas). Basta lembrar como as manifestações de rua de junho de 2013 ou mesmo as últimas eleições foram alimentadas pelo Twitter e Facebook. Ou então como o contato com arte e entretenimento ganhou novas dimensões, pois a qualquer hora é possível ver um programa de 2014 ou de 1969 pelo Youtube ou Netflix. Livros podem ser lidos em pdf, músicas ouvidas em mp3, o que faz a produção intelectual alcançar um nível antes inimaginável, ao mesmo tempo em que questões como direitos autorais passam a ser repensadas.
Por fim, muita atenção deve ser dada à dinâmica de uma questão do ENEM, muito diferente da de outros vestibulares. Esse grande exame nacional apresentará sempre um texto estímulo, um enunciado que inicialmente o contextualiza ou o resume e – o mais importante – uma última oração que apresenta um comando que deve ser atendido. Vejamos um exemplo:


(Disponível em www.ccsp.com.br
Acesso em: 26 jul.2010 – adaptado.)

O anúncio publicitário está internamente ligado ao ideário de consumo quando sua função é vender um produto. No texto apresentado, utilizam-se elementos linguísticos e extralinguísticos para divulgar a atração “Noites do Terror”, de um parque de diversões. O entendimento da propaganda requer do leitor
a)      a identificação com o público-alvo a que se destina o anúncio.
b)      a avaliação da imagem como uma sátira às atrações de terror.
c)      a atenção para a imagem da parte do corpo humano selecionada aleatoriamente.
d)      o reconhecimento do intertexto entre a publicidade e um dito popular.
e)      a percepção do sentido da expressão “noites do terror”, equivalente à expressão “noites de terror”.

Note que essa questão exige em primeiro lugar que se entenda que a imagem faz parte de uma propaganda. Além disso, deve-se perceber o que está sendo retratado: um pé com uma etiqueta colada ao dedo, o que remete ao processo de identificação de cadáveres em um necrotério. Dessa forma, o estudante com competência linguística capta uma referência a algo macabro – coerente com o produto divulgado. Além disso, o examinando tem que mostrar inteligência ao notar que a grande jogada do anúncio publicitário é tornar sua mensagem chamativa e para isso é bastante comum o emprego de jogos de linguagem, como o que aconteceu na frase “Quem é morto sempre aparece”, que surpreende ao inverter o dito popular “Quem é vivo sempre aparece”. Assim, depois de feita essa análise, o candidato já tem em mente qual é a resposta antes mesmo de saber as alternativas apresentadas. Seu trabalho será entender a proposta, apresentada na última oração do enunciado, e a partir de então meramente localizar a letra correta, sem se preocupar com a eliminação das erradas. Quem não entende essa dinâmica acaba muitas vezes caindo em um problema muito comum: achar que mais de uma alternativa está correta. Na verdade, quem incorre nesse erro, ou não conhece a matéria cobrada, ou não entende o texto-estímulo, ou (aqui está a falha comum e mais simples de ser evitada) não leu atentamente o comando apresentado na última oração do enunciado.  
Enfim, a proposta do ENEM, apesar dos tropeços que o arranharam, é muito bem intencionada: avaliar o aluno dotado de competência linguística, aquela que fará, pois, um profissional e um cidadão eficiente. Resta então aO Magriço Cibernético desejar que seus leitores tenham um excelente desempenho neste final de semana. Boa prova a todos!


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domingo, 10 de agosto de 2014

Texto: cuidados necessários em sua construção



Um conceito que não pode ser deixado de lado durante a leitura é o de que texto nunca se constitui com um simples amontoado de palavras, ideias e frases. Seu sentido se estabelece por meio da ligação que esses elementos estabelecem entre si e com o contexto histórico-social em que estão inseridos. Deve ser, portanto, entendido em seu conjunto, nunca em suas partes isoladas. Trata-se de um fato de grande importância, por isso foi várias vezes repetido nO Magriço Cibernético – e muitas mais vezes ainda o será. Esquecê-lo pode provocar sérios problemas não só na leitura e interpretação, mas também na redação, como o que ocorreu na propaganda acima (Revista Linha Direta, setembro de 2013, p. 77).
Em um primeiro momento, a mensagem é bastante simples. Há três fases em que uma instituição pode estar: uma inicial, representada por um livro pequeno de conto de fadas; uma intermediária, representada por um livro mediano sobre história da arte; e uma avançada, representada por um livro grande sobre gestão de negócios. O tamanho da publicação indica o estágio em que se encontra a empresa: básico, intermediário ou avançado. Dessa forma, a Totvs propõe-se a ajudar na gestão dessas firmas, apresentando propostas tecnológicas que se adaptem ao nível em que se encontram. Daí a associação de um pequenino livro de contos de fadas ao ano 1 e o de um volumoso de gestão de negócios ao ano 4.
O problema é que a ligação entre os elementos que compõem essa peça publicitária abre caminho para outra sorte de ideias. O que mais chama a atenção é considerar como conhecimento de nível intermediário o relacionado à história da arte, enquanto o de gestão de negócios é mostrado como avançado. É certo que se trata de um conceito bastante difundido em nossa sociedade, que valoriza o lucro, muitas vezes em detrimento de questões mais humanas. No entanto, é estranho que esse pensamento apareça em uma revista da área de educação, já que seu público (teoricamente) não lida com preconceitos – o que o anúncio acaba veiculando, mesmo que inadvertidamente. Arte não é um conhecimento menor em relação à administração financeira. Aliás, uma boa publicação de historiografia estética é bem mais volumosa do que à de gestão de negócios apresentada. Além disso, o próprio conhecimento sobre os contos de fada ocuparia livros bem mais extensos. Basta ler Bruno Bettelhein com o seu A Psicanálise dos contos de fadas ou Marie-Louise von Franz com o seu A sombra e o mal nos contos de fada.
Essas considerações permitem entender, portanto, que a articulação de elementos é o que dá sentido a um texto. Manipulá-los de forma desajeitada, seja na leitura, seja na redação, pode gerar, como se observou na propaganda acima, problemas indesejados na comunicação.


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domingo, 18 de maio de 2014

Pode a arte influenciar comportamentos? Os casos de Werther, Anna Karenina, Domingo Sombrio e Ozzy Osbourne.

Em 1933, o húngaro Rezsoe Seress, após uma decepção amorosa, compôs “Szomorú Vasárnap”, título que pode ser traduzido em português como “Domingo sombrio”. Trata-se de uma canção que, conforme atestado no vídeo acima, fala da tristeza da ausência da amada, além de ter como tema a consciência extremamente desencantada de uma sociedade em crise. Seu final é bastante emblemático: “o mundo acabou”. O fato é que essa peça começou a ser associada a muitas histórias sensacionalistas, algumas sem comprovação: a amada de Seress, que o havia dispensado, pôs fim a sua própria vida, sendo encontrada morta ao lado de um papel com a transcrição da letra da música em questão; uma onda de suicídio teria sido desencadeada então na Hungria e em outras partes do mundo por onde “Szomorú Vasárnap” passava; a BBC havia proibido a execução da tradução dessa canção em 1940; no ano seguinte, Billie Holiday gravava nos Estados Unidos a versão “Gloomy Sunday” (fato), após uma intensa campanha de marketing (fato) que atribuía à obra o título de “a música mais triste do mundo” ou de “a música suicida”, ajudando a trazer à baila muita invenção típica de lenda urbana. Por fim, em 1968, Seress atirou-se de um prédio, livrando-se do peso que essa obra representava sobre seus ombros.


 Quando se fala na influência de “Szomorú Vasárnap”, aqueles que estão familiarizados com o universo da música pop lembram-se imediatamente de “Suicide Solution”, do álbum que Ozzy Osbourne lançou em 1980, Blizzard of Ozz. Não se tem certeza do que inspirou essa composição. Há quem diga que ela se refira às crises de alcoolismo do próprio cantor. Outros afirmam que se refira a um seu companheiro de rock que encontrou a morte graças a esse vício. Mas o fato que pesa contra essa peça é que em 1984 o norte-americano John McCullom, de 19 anos, suicidara-se ouvindo a música desse roqueiro. Apesar de o jovem estar escutando no seu quarto o álbum Speak of the Devil (1982) no momento em que deu fim à vida, seus pais alegaram que ele havia ouvido antes na sala Diary of a Madman (1981) e o fatídico Blizzard of Ozz. Foi o suficiente para que entrassem com processo contra o músico e a gravadora, alegando que “Suicide Solution” é que havia exercido nefasta influência. Gente que não entendeu o jogo ambíguo de palavras: “suicide solution”, ou “solução suicida”, é uma referência à bebida, solução (no sentido de líquido em que se dissolve algo, seja outra substância, seja algum problema da vida) que lentamente conduzia à morte – e tomá-la com consciência desse risco era uma atitude suicida. No fim, o artista ganhou a causa, mas não se pode esquecer que esse acontecimento, além de ter dado notoriedade ao que ele produzia, pôs à tona uma questão: pode a arte influenciar comportamentos?


Antes que se levante a hipótese de que uma interferência perniciosa só poderia vir de arte de baixa qualidade, qualificação que o senso comum (que nem sempre tem conhecimento da verdade...) costuma atribuir à produção voltada às massas, deve-se lembrar o exemplo de Anna Karenina, romance que o russo Leon Tolstói publicou em 1877. A protagonista que dá nome ao livro suicidou-se atirando-se à frente de um trem que chegava à estação, o que inspirou muitas moças da época, igualmente descontentes com a vida, a praticarem o mesmo ato.


Entretanto, o exemplo mais famoso nesse campo é Os Sofrimentos do Jovem Werther, romance que Goethe publicou em 1774 e que alguns diziam que possuía um caráter autobiográfico: o autor também fora apaixonado por uma mulher chamada Carlota, noiva de um amigo. A influência que essa obra exerceu pode ser primeiramente percebida no fato de a vestimenta do protagonista, casaca azul e colete e calça amarelos, ter passado a ser item essencial para os jovens de então. Mas a força dessa obra foi além do vestuário. Werther matou-se ao perceber que não ia conseguir realizar o seu amor. Boa parte dos leitores dessa obra resolveu fazer o mesmo, o que acabou gerando a maior onda de suicídio que a Europa conheceu.

Werther, personagem de Goethe.

Mas o que é útil aqui não é se a arte tem realmente tal poder sobre o comportamento das pessoas a ponto de fazê-las deixar de enxergar validade na existência. Mais importante é entender porque alguns, inspirados no que ouvem, veem ou leem, entregam-se à turbulência de um romance, de um filme ou de uma música, passando a imitá-los. O que se quer colocar em pauta, portanto, é que esses são exemplos do que muitas vezes se falou nO Magriço Cibernético: o texto é uma articulação de ideias que se dá tanto interna quanto externamente. Assim, é certo que esses autores utilizaram experiências pessoais na construção de suas obras. Entretanto, deve-se lembrar que, como antenas da sociedade, captaram o espírito de seu tempo, o zeitgeist. Goethe sintonizou a desestabilização da mudança do mundo antigo para o atual, o que era a base de toda a efervescência romântica. Tolstói provavelmente acumulou em sua obra as suas inquietações de se ver em meio a uma Rússia czarista, que queria ser Europa, mas que no fundo se comportava como um universo à parte (até hoje...). Seress sentiu a angústia do Entre Guerras, a agonia de ser tragado pela iminência de um apocalipse, além do desencanto ao ver que a tão ansiada promessa de um mundo melhor não viera, como bem expressara Drummond em “A Flor e a Náusea” (1945):

Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.

Ozzy verbalizou em sua letra maldita o mal-estar de uma sociedade norte-americana que ainda não havia cicatrizado as feridas do Vietnã e que tinha sido humilhada pelo que ocorrera na embaixada no Irã, sem mencionar a crise econômica que arranhava o poderio dessa nação. Essa música acabaria por vaticinar, pois, o clima que dominaria toda a década de 1980, marcada pelo caráter sombrio de darks, góticos, metaleiros e que acabou tão bem sintetizado na estética sem sorriso de Blade Runner (1982).
Dessa forma, o que essas obras provam é que a arte, como produção histórica (diriam os marxistas) ou como total expressão do self (como diriam os junguianos), é fruto de articulações múltiplas. Por um lado, é a expressão de angústias pessoais. Por outro, é fruto do que o espírito de um tempo imprime no seu autor, que acaba digerindo-o e devolvendo-o ao seu meio. Nesse ponto, cria-se uma via de mão dupla: ao mesmo tempo em que a um trabalho estético influencia o indivíduo, este também o influencia. Em outras palavras: a arte influencia comportamentos, mas é também influenciado por eles. Compreender esse jogo é entender a beleza da dinamicidade de um texto.



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domingo, 11 de maio de 2014

Viagens na Minha Terra: afinal, do que fala esse livro?

Ilustração de Carlos e Joaninha por Paulo Ferreira para a edição de 1946
da Liv. Tavares Martins de Viagens na Minha Terra

Viagens na Minha Terra começou a ser publicado em 1843 na forma de folhetim, ou seja, seriadamente na Revista Universal Lisbonense, mas teve sua edição suspensa, o que já é um sinal de que desde o início era uma obra cercada de dificuldade de aceitação entre o grande público. Em 1846 aparece na forma de livro, tornando-se uma obra ímpar no contexto português, mas filiada a uma tradição que reúne Laurence Sterne na Inglaterra, Xavier de Maistre da França e Machado de Assis no Brasil. Entretanto, apesar de ser um dos monumentos da literatura em nossa língua, seu contato é muito penoso para os vestibulandos, o que o faz ser companheiro de A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós, na lista das obras com maior índice de desistência de leitura.
A tarefa árdua dos estudantes na apreciação de Viagens na Minha Terra se deve ao caráter intensamente digressivo da obra. Tem-se a impressão que ela fala de tudo, vai para todas as direções, sem se chegar a lugar algum. O jovem valoroso que finalmente consegue chegar até a metade do livro tem um vislumbre de que há três histórias principais (a da viagem de Garrett até Santarém, a do amor entre Carlos e Joaninha e a da Guerra Civil Portuguesa), mas todas elas desconexas, ainda mais quando são somadas a todas aquelas considerações sobre monumentos portugueses, a diferença entre o homem do campo e o homem do litoral, escritores como Dante, Byron, Camões, figuras políticas como Marquês de Pombal, econômicas como o barão de Rothschild, literárias como Dom Quixote e Sancho Pança...
Nesse ponto, toca-se numa ponta da meada (imagem muito comum e igualmente importante para a compreensão da lógica do romance) que, se puxada, desembaraça toda essa complicação: a oposição entre Dom Quixote e Sancho Pança. Trata-se de duas personagens do romance Dom Quixote (1605) do espanhol Miguel de Cervantes, considerada uma das obras fundamentais da literatura mundial. O que elas representam para Garrett é explicado por uma longa digressão (mais uma...). O protagonista que dá nome ao romance hispânico é um homem que, de tanto haver lido novelas de cavalaria, enlouqueceu a ponto de imaginar que era um cavaleiro andante a continuar as aventuras que havia visto nos livros. Alienado nesse mundo de fantasia, destaca-se em uma cena famosíssima, aquela em que luta contra moinhos de vento, pois imagina que eram gigantes. Na lógica de Viagens na Minha Terra ele passa a representar o idealismo, valor muito caro à literatura romântica. Mas essa personagem tem como companheiro o escudeiro Sancho Pança, mais preocupado com questões práticas ligadas à sobrevivência imediata. Representa o materialismo, ou, na lógica do romance de Garrett, o pragmatismo, o utilitarismo, tão caro aos burgueses que se alimentaram e se aproveitaram do Romantismo.


Nesse sentido, o grande tema de Viagens na Minha Terra é o conflito entre idealismo e pragmatismo. Trata-se de uma questão bastante dolorosa não só para a pessoa Garrett, mas também para sua materialização na figura do narrador, assim como para Carlos, Portugal, a sociedade em que estão mergulhados e até o próprio Romantismo. Deve-se lembrar que esse movimento, fruto das expectativas com relação aos ideais da Revolução Francesa, pena uma profunda decepção ao descobrir que essa mudança social serviu apenas para que a burguesia subisse ao poder, sem sanar antigos problemas. Pior: abriu caminho para mais um tirano como tantos outros – Napoleão. Decepção semelhante é vivenciada por Garrett, que participara da Guerra Civil Portuguesa em nome da modernidade representada pelo liberalismo, que de fato vencera. No entanto, a sociedade que ele via à sua frente era a do materialismo, do pragmatismo burguês, mais preocupado com o lucro do que com grandes ideais. É por isso que o autor vive reclamando do abandono em que se encontram grandes monumentos ligados à História e aos Ideais lusitanos. O autor e Portugal lutaram por isso? É nesse sentido que se deve também encaixar a tragédia de Carlos, que em muito se assemelha à do autor. Também lutara por seus ideais, mas acaba descobrindo ser filho de tudo o que há de mais reacionário em seu país. Seu destino é também o pragmatismo: torna-se barão, ou seja, um homem voltado para a especulação financeira, carreira na qual obtém tanto sucesso que pode até se tornar deputado, o que significa que influenciará (negativamente) os rumos de sua pátria.
O drama de Viagens na Minha Terra mostra-se singularmente bastante atual, pois vivemos uma época em que nobres questões éticas soam como vazias. Recentemente vimos o presidente Bush comandar uma invasão ao Iraque sob o pretexto de que lá havia armas de destruição em massa, fato não comprovado. Ainda assim, fora reeleito. Quando a economia do país que comanda economia degringolou, não conseguiu fazer eleito o seu candidato. Aqui no Brasil, políticos veem-se cercados de escândalos de corrupção e incompetência, mas enquanto a economia está bem, são eleitos e reeleitos. Quando as questões pragmáticas, quando a ração do “povo marcado e povo feliz” fica comprometida, os índices de popularidade caem a níveis preocupantes. Como dizia o Velho do Restelo, em Os Lusíadas, “mísera sorte, estranha condição” a humana.



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domingo, 4 de maio de 2014

Star Wars: a força que está conosco

4 de maio foi escolhido para se celebrar o universo Star Wars por um motivo bastante simples: em inglês, a expressão que nomeia essa dia, “May the fourth” (May, 4th) é parônima do começo de “May the Force be with you” (“Que a Força esteja com você”), frase emblemática dessa saga de ficção científica. Assim, vislumbra-se o poder dessa criação de George Lucas, pois um simples trocadilho é capaz de movimentar milhões de pessoas em torno de uma data quase que fortuita.
Não se pode negar o lado financeiro desse feito, que é respeitável. Pode não ter sido Lucas o descobridor, mas com certeza foi ele quem consagrou essa veia lucrativa que é uma franquia. O cinema aprendeu a faturar não apenas com bilheteria, não apenas com sequências, mas também com produtos ligados ao filme, desde álbuns de figurinhas, brinquedos, miniaturas, livros, quadrinhos, trilha sonora... Trata-se de uma verdadeira fábrica incansável de fazer dinheiro. E quando se pensa que ela vai parar, volta com mais força, seja na reedição dos filmes mais velhos, seja na estreia da animação, seja na publicação de versões em 3D, seja no lançamento de mais uma trilogia, ansiosamente aguardada e certamente tão rentável quanto as duas anteriores.
  


O poder de Guerra nas Estrelas é tanto que vai além da sala de cinema. Basta lembrar que inspirou o nome de um projeto de defesa dos Estados Unidos. Basta lembrar que a filosofia jedi já é vista como uma religião e com milhares de adeptos. Basta lembrar o frisson provocado pelo anúncio da nova trilogia, que consagrou o termo “prequel” (ou “prequela”, como querem os puristas). Basta lembrar que o lançamento do Episódio I: A Ameaça Fantasma (1999) ocupou espaço amplo na imprensa, sendo capa da Veja, Época, Istoé, recebendo até cobertura da CNN. Basta lembrar que os fãs lotavam salas de filmes pouco memoráveis apenas para assistir aos trailers de Star Wars, e nada mais, provocando uma debandada antes da exibição da peça principal.
Não há como negar, entretanto, alguns aspectos negativos. Guerra nas Estrelas nunca ganhou um Oscar de renome, somente os de categorias técnicas. Sua bilheteria foi batida, por exemplo, por Titanic (1997), Avatar (2009). Além disso, o Episódio I: A Ameaça Fantasma causou uma grande decepção entre o público. Talvez porque a expectativa fosse muito grande. O universo Star Wars já estava disseminado no imaginário de milhões, entrando naquele campo mítico ou platônico de nossa estrutura mental, do qual muitas vezes nada deveria sair. Ver o ideal se realizando é chance certa de frustração, ainda mais quando o filme é sobre uma criança interpretada por alguém sem o talento de um Haley Joel Osment em O Sexto Sentido (1999). O que havia de emocionante nesse episódio? O início, com o encontro dos negociadores jedis com os representantes da Federação Comercial, a competição de pod racer (inspirada na corrida de bigas em Ben Hur, de 1959), o tour pela capital Coruscant, o contato com o Senado e o Conselho Jedi, e a batalha final. Fora isso, um atoleiro de marasmo. E que vilão mais insosso era aquele Darth Maul? E quem explica Jar Jar Binks? A impressão que se ficou era a de que ocorrera muito espetáculo, muito luxo, muito efeito especial para pouca ação. Paralelo a essa frustração veio o sucesso de Matrix (1999), que inaugurava uma trilogia que, muitos diziam, abria uma nova era para a qual não existia mais espaço para Star Wars.
Hoje, Matrix já não está mais moda. Titanic não causa mais agitação. A novidade de Avatar parece que já ficou datada. Mas Guerra nas Estrelas continua vivo, como a data de hoje demonstra, fazendo esse universo não se circunscrever aos que eram crianças e adolescentes nos idos de 1978. Até adolescentes de 2016 se veem fissurados nessa saga. Mas como explicar a longevidade desse sucesso?

 


Não há como negar que houve um senso de oportunismo de Lucas. Em primeiro lugar, sua obra é um pastiche de elementos culturais. Encontramos nela referências ao western, às histórias de kung fu, de samurais, a Flash Gordon, ao clássico 2001 (1968), de Stanley Kubrick, à cultura indiana... Mas há que se lembrar também que o cineasta  soube adaptar-se aos novos tempos, sem manchar o caráter mítico de sua saga. Se na passagem dos anos 1970 para 1980 cabia muito bem uma história maniqueísta, mostrando o embate entre o Império e a Aliança Rebelde, na nova trilogia houve um amadurecimento notável. O conflito que deu origem à história do Episódio I: A Ameaça Fantasma tem ingredientes de embargo econômico, sanções, bloqueio de fronteiras, democracia minada por corrupção, negociações políticas infindáveis que não resolvem problemas sociais. Assuntos atualíssimos. O Episódio II: O Ataque dos Clones (2002) até mexia com um tema palpitante, a clonagem – mas ele já havia sido anunciado no Episódio IV: Uma Nova Esperança (1977). Ainda assim, sua contemporaneidade se vê nas referências constantes a ataques terroristas que padecem sobre Amidala. Mas tudo começa a ficar mais sério quando se nota que uma guerra está sendo engendrada só para que o senador Palpatine ganhe poder. Quem seria louco para se beneficiar de um conflito sangrento, iludir toda uma nação e se tornar onipotente? Nesse momento, nosso senso crítico daria um sinal de alerta, recorrendo a tantos governantes na história de nossa civilização.

 

Entretanto, o ápice desse tipo de oportunismo virá com o mais maduro de todos os filmes, o Episódio III: A Vingança de Sith (2005). É nele que se percebe o conflito entre o pragmatismo capitalista, alegorizado no Império, e o bem-estar individual, alegorizado na filosofia jedi. Mas quando se ouve da boca do recém-decaído Anakin Skywalker uma frase que parece ter saído do Bush caçador de terroristas (“Ou você está comigo, ou você está contra mim.”), a ponte com o contexto histórico-social fica mais clara. Aliás, profundidade é o que esse filme tem de sobra em relação aos outros, principalmente nos questionamentos filosóficos quanto à fronteira entre o bem e o mal (Pode-se fazer algo errado em nome do bem? E pode-se fazer algo certo em nome do mal?), o que leva o protagonista a uma crise sem retorno. Os temas ingênuos da infância estavam então sepultados. E o tom fúnebre com que o filme se encerra parece servir também ao final doloroso de todo o clima feérico que a trilogia carregava. É inquestionável: sai-se dessa película com um mal-estar. Belo, mas terrível.

   

Entretanto, Star Wars vai muito além dessas alegorias ao contexto histórico em que está inserido. Há algo de mais profundo, e temos uma noção do seu alcance quando se tem em mente a formação de George Lucas. Sabe-se que esse cineasta foi aluno de Joseph Campbell, antropólogo que estudou a estrutura dos mitos de várias culturas. Ele é que deve ter ensinado o dono da poderosa franquia a entender que o que nos fascina em tantas histórias, por mais fabulosas que sejam, por mais antigas que sejam, é que no fundo elas falam de nós mesmos. Assim, Guerra nas Estrelas é uma fábula de ficção científica a nos ensinar que, ainda que o avanço tecnológico seja notável, a ponto de destacar o papel da máquina, o mais importante, a fonte de todas as mudanças é o homem. E o grande tema campbelliano, a jornada do herói, nada mais é do que a busca de nossa realização interior, que passa por um processo de descoberta, tentação, queda e, o que é mais glorioso, redenção. O mal está em toda parte. Como dizia o apóstolo Paulo, os soldados da malignidade são muito mais eficientes, o que se comprova pela facilidade com que o que é ruim toma conta do mundo. Isso significa que somos propensos à degradação, que nossa essência má é latente e forte. Mas saber que, por piores que sejamos, podemos nos resgatar é muito gratificante. E é isso que os seis episódios de Star Wars nos mostram. Por isso seu aspecto apaixonante.


 Resumos, análises e comparações:
FUVEST-UNICAMP 2015.
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