quarta-feira, 14 de março de 2012

Propaganda europeia acusada de racismo contra Brasil, Índia e China


O vídeo de hoje é bastante útil porque servirá como exercício de recapitulação de tudo o que foi discutido nO Magriço Cibernético. Com ele mais uma vez conseguiremos ver que o sentido de um texto se dá na ligação que seus elementos estabelecem entre si. O conjunto é o que interessa e não um ingrediente específico, isolado. Além disso, o significado de uma mensagem também está garantido pela relação que ela possui com o contexto histórico-social em que está inserida. É importante, ainda, ter em mente o tipo de receptor para que a comunicação se efetive. Por fim, conforme foi abordado no último post, recentemente se tem mostrado uma grande preocupação (válida ou não) em não ferir suscetibilidades sociais, o que provocaria celeumas que teriam como consequência a desastrosa distorção da informação que se quer transmitir.
Há poucos dias, foi lançada no Youtube uma propaganda destinada ao público jovem e que tinha a intenção de incentivar a aceitação do aumento da adesão de membros da União Europeia. Nessa peça publicitária, uma jovem branca representa a referida agremiação político-econômica. É interessante notar que usa uma roupa que lembra a da protagonista de Kill Bill, que é uma mulher determinada em sua sede de vingança. Essa referência também é estabelecida pela música que é assoviada o fundo. Tal conexão permite que se faça uma pergunta que poderia não só comprometer a coerência interna do vídeo (a personagem não é uma vingadora), mas também ligá-lo a ideias impróprias (do que ou de quem a União Europeia estaria tirando desforra?).
A moça é então confrontada por três lutadores. O primeiro entra em cena demonstrando suas habilidades em kung fu. Ao fundo, o som de um gongo cria o clima típico do Extremo Oriente. Dentro do contexto em que foi construído o comercial, logo se infere que se trata da China. Surge então, ao eco de uma cítara, um indiano que exibe dotes em uma arte marcial que lhe permite o controle do próprio corpo, tornando-o até capaz de levitação e de uma surpreendente locomoção pelo ar. É a Índia. Por último, arrebentando a porta e embalado por toques de samba, aparece um negro exibindo todo o seu gingado em capoeira. Brasil.
Três homens contra uma mulher se configuraria numa batalha de extrema desigualdade ou até mesmo uma covardia. E o que isso tudo parece significar? Que a União Europeia está sendo ameaçada pelo BRIC, grupo de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China.
Diante dessa situação periclitante, o que faz a protagonista? Calmamente – como em todo o comercial – ela se concentra e se multiplica por doze (o número de estrelas que compõem o símbolo da União Europeia), cercando seus desafiadores. Estes, diante do novo quadro, depõem sua disposição de lutar. As mulheres se sentam, no que são acompanhadas pelos ex-opositores, um gesto que configura uma disposição para o diálogo e debate.
Essa publicidade é eficiente em conquistar seus objetivos, pois utiliza elementos que rapidamente criam empatia com o seu destinatário: a protagonista jovem e aparentemente frágil, mas que sabiamente se desvencilha de obstáculos; a referência a um filme de sucesso que faz parte do repertório cultural de seus espectadores. Entretanto, essa mesma facilidade fez com que pagasse um preço bem alto: rapidamente suscitou reações polêmicas e inflamadas.
A primeira crítica que foi levantada refere-se ao fato de que a divulgada calma e sabedoria da personagem principal foram tomadas como sinal de arrogância da União Europeia, que se mostra superior a nações apresentadas como bárbaras. Assim, ela no final se mostraria uma negociadora pacífica ou simplesmente uma acuadora?
Além disso, surgiu a acusação de que esse comercial seria racista, o que fez os seus responsáveis retirarem-no do ar e pedirem desculpas pelo mal-entendido. Há nesse ponto alguns aspectos que merecem ser discutidos.
O racismo poderia estar configurado pela ausência de um dos BRIC: a Rússia. Ela não é vista como ameaça à União Europeia, mesmo não fazendo parte dela. Será que é porque esse sistema político-econômico depende dos combustíveis fósseis que o já não mais gigante vermelho fornece? Ou é porque de uma forma ou de outra ele divide a mesma cultura que os 27 países quem compõe as nações representadas pelas 12 estrelas? Então a questão não é apenas econômica, mas também cultural?
Outro aspecto que merece análise no que se refere ao presumido racismo: apresentou-se uma imagem redutora e, portanto, politicamente incorreta de Brasil, Índia e China. Essas representações recorreram a estereótipos que reforçariam preconceitos. De fato, muitos brasileiros poderiam dizer que não são negros e capoeiristas, assim como alguns indianos diriam que não dominam artes marciais e chineses afirmariam que não sabem nada de kung fu. Entretanto, o reverso da moeda comprometeria esse raciocínio: muitos europeus também não são brancos.
Deve-se lembrar, portanto, que as personagens precisam ser estereotipadas por causa da qualidade de texto em que estão inseridas. Trata-se de uma peça publicitária de pouco mais de um minuto. Para isso, trabalha-se com representações, alegorias, procedimento linguístico que não utiliza pessoas reais, de carne e osso, mas representações. Tais inevitavelmente são caricaturizações, ou seja, traços típicos exagerados. São perfeitas para o caráter diminuto do comercial. Não caberia nesse espaço exíguo e de comunicação imediata a prolixidade do politicamente correto. Não há como dizer, por exemplo, que esse negro capoeirista representa o Brasil e ainda ressalvar que há muitos brasileiros, entretanto, que não são capoeiristas, muito menos afrodescendentes. Em contrapartida, o que seria discutido se as personagens representando China, Brasil e Índia não estivessem dentro dos estereótipos? Será que se diria que os europeus seriam tão ignorantes que nem teriam noção de como esses povos são?
Em vista de tudo o que foi abordado aqui, o que se propõe agora é que você analise tudo o que foi exposto e apresente aO Magriço Cibernético a sua opinião. Sinta-se à vontade.

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9 comentários:

  1. A Europa e seu solo naturalmente pobre, putrefato após anos de exploração decorrentes a Revolução Industrial, se encontra em hipossuficiência dos recursos que necessita para sua homeostase e crescimento.
    Agora, é obrigada a encarar a insustentabilidade do sistema que construiu, manifestada pelas recentes e graves crises. Pois não está a Grécia, segundo alguns economistas, irremediavelmente fodida, digo, falida? Pois não foi o Brasil quem os emprestou grana? Não é a China quem promete uma injeção monetária?
    As consequências de se colocar em um mesmo bloco, nações tão industriais como a Alemanha, com nações como Espanha e Portugal, só não são claras aos olhos míopes do conservadorismo liberal. Os mesmos que se recusam a enxergar sua decadência, que se recusam a aceitar que todos os impérios chegam ao fim. Que se perdem em devaneios sobre seu passado hegemônico e não percebem que no presente, com manifestações como essas, assemelham-se a velhos caducos e arrogantes.
    Triste é saber que mesmo com tanto potencial, estamos longe, assumamos, de fazer valer nossos interesses. Triste é saber que para fossemos soberanos bastariam lideranças fortes. Desprezando o conjunto necessário para que isso aconteça, temos, em suma, um problema de gestão.
    Desculpe-me a exaltação, mas tanto potencial desperdiçado... Já nos alertara Monteiro Lobato, paremos de fazer queimadas!

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  2. Olhos míopes do conservadorismo liberal? Haha, faz-me rir. Desculpe-me, Laudemir, começar pelo comentário do amigo acima. Mas é como eu havia lhe dito. Os devaneios ideológicos, como sempre, bagunçam e norteiam as análises. Acho isso profundamente triste e prejudicial. Isso quando ele não começa a atrapalhar o andamento do blog.

    Contudo, vamos ao texto, aliás, tô virando leitor assíduo do teu blog. Pô, sua análise é perfeita meu velho. Tá dando gosto ler. A explicação do vídeo foi certinha, descreveu com precisão o ambiente que ocorre lá na União Europeia, sem exageros. Na propaganda, eu, sinceramente, não constatei racismo, com exceção da ausência da Rússia – conforme você citou. No que diz respeito da representação de estereótipos, o que foi feito, na minha opinião, não pode ser caracterizado como racismo - justamente por abordar uma imagem, que, muitas vezes o próprio país exporta. E também, nesse caso, é utilizado como um recurso para identificar o país de forma rápida, ao passo que a propaganda terá apenas alguns segundos para ser exibida. Exatamente como vc disse no trecho:

    “As personagens precisam ser estereotipadas por causa da qualidade de texto em que estão inseridas. Trata-se de uma peça publicitária de pouco mais de um minuto. Para isso, trabalha-se com representações, alegorias, procedimento linguístico que não utiliza pessoas reais, de carne e osso, mas representações. Tais inevitavelmente são caricaturizações, ou seja, traços típicos exagerados. São perfeitas para o caráter diminuto do comercial. Não caberia nesse espaço exíguo e de comunicação imediata a prolixidade do politicamente correto.”

    Acredito, no entanto, que tal propaganda só tenha gerado polemica e discursos inflamados por atingir, sobretudo, aqui no Brasil, um determinado perfil ideológico. Então, em decorrência da do antagonismo de pensamento, acaba-se por taxar e rotular, muitas vezes de forma malandra, o material exibido. Por isso é preciso muita atenção na hora de passar para frente algumas ideias. Pode ser que estejamos sendo vitimas de vigarice partidária. Acredito que por mais erros que a União Europeia tenha cometido, ela dificilmente divulgaria um vídeo de caráter racista. Gostemos, ou não, o velho continente é exemplo de tolerância étnica e religiosa há um bocado de décadas. Acho que seria um equivoco atribuir a ela este caráter.

    No caso do vidro de azeite Galo, do post anterior, ficou constatado racismo – inclusive a justiça já tirou a mesma de circulação. Nele, de forma infeliz, muito provavelmente uma agencia publicitária, após escolher mal o texto da propaganda, fez uma relação de mau gosto. Detalhe, a mesma não provocou polemica e nem discussões inflamadas. Deveria e poderia fazê-lo – não fez. Já aqui, no caso da propaganda da União Europeia, muito provavelmente pela falta de argumentação, incitou-se, sabe-se lá quem, e criou-se, de forma maldosa, um estardalhaço desnecessário e descabido que não correspondente ao conteúdo apresentado.

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  3. Oi Laudemir, lendo e relendo seu blog aguço minha memória nas razões de adorar suas aulas na época dos estudos e achei muito interessante o post.
    Opinando a respeito, o grande foco dessa propaganda é o seu palco tão fragil de más interpretações,chamado mundo economico. O confronto proposto é o típico lar de discórdias (União Européia) que precisa se fortalecer para o externo(BRIC) que decidiu apontar seus defeitos ou eles mesmo surgirem mediante ao enfraquecimento declarado. A alusão Tarantinesca mesmo que impulsionando o interesse do publico alvo é o ponto mais desastrado do video,é ela que instiga o olhar pra batalha,para o racismo,e para a prepotencia,ora quem mais prepotente que a Noiva,Beatrix Kid. O video simplifica tudo nessa ilusão teatral,justa na esteriotipação das nações,mas descompromissada com a geopolítica do palco.
    Aiai se eu fosse um lutador viril de capoeira...aiai

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    1. Beatrix Kiddo, corrigindo o nome da linda Uma no Kill Bill.

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    2. Gostei muito de suas observações. Você demonstra ser uma pessoa com boa repertório cultural e sabe o que fazer com ele. Esse é um delicioso traço indicador de inteligência. Quero ver mais participações suas aqui nO Magriço Cibernético!

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  4. Longe de desviar dos objetivos do blog, acredito ser impossível desvincilhar um texto de seu contexto histórico. Comentá-lo, da forma mais neutra possível, fora o objetivo do meu primeiro comentário, embora possa ter tropeçado no calor de uma primeira leitura.
    Quanto aos elementos constituintes do texto, não vejo o que acrescentar à sua dissecação, que mais uma vez beirou uma biópsia! rs. Isto sem correr o risco de prolixidades ou redundâncias vazias ao ratificá-la, naturalmente.
    Revendo o vídeo reflito sobre suas intenções: Após a tensão de um combate iminente, a União Européia, alegorizada na personagem feminina, envolve o "BRIC" em sua onipotência.
    E tendo em mente o discurso de Barack Obama no Parlamento britânico,"Países como Índia e o Brasil, na verdade, só estão crescendo graças a liderança de americanos e britânicos", o vídeo ecoa como uma reformulação do discurso para o público jovem.
    Revendo também o post anterior, sobre o vidro escuro ser o segurança, me surgiu que tal colocação possa ter se referido ao traje preto típico dos seguranças. O que você acha?
    De qualquer maneira prossegue um texto mal estruturado, com ampla margem para se inferir uma sugestão racista. Admira-me ter entrado em circulação, em plena "ditadura do politicamente correto", e ainda vinculado a uma marca de varejo.

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  5. Luiz Eduardo, agradeço a sua atenção e agradeço ainda mais o fato novo que você me apresentou - o discurso de Obama. De fato, ecoa muito bem na propaganda da União Europeia. Ela se senta, cercando os BRIC, numa posição de quem vai ensinar. E quanto às suas observações sobre o azeite, você tem razão - é provável que haja uma referência ao preto do uniforme de segurança, mas foi um texto mal construído.
    Ah! E obrigado pelo elogio!

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  6. Hahaha é claro que a união ta querendo engolir a gente e todo o resto, os únicos que não tão se dando tão mal quanto ela são os emergentes, por quê? Oras! Porque são os que crescem mesmo com todas as podadas que recebem das grandes nações, como sanções, fechamento de mercado, paz romana também! Só acho isso um pouco precipitado... Quem garante que não são eles que serão engolidos? É por isso que querem fazer antes? Cara isso é muita hipocrisia ein?! Unidos somos mais fortes... Tá querendo se unir por quê? Isso é a maior demonstração de medo que já vi até hoje...

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  7. cara assim, o problema não foi mostrar brasileiro como negro capoeirista, indiano com um velho de turbante, e chines como lutador de kung fu, o problema foi mostra nós BRICS, como uma ameaça, como se nós estivessemos tentando fud..., digo competir com a europa, nós queremos apenas o nosso lugar ao sol e a longo prazo, quanto mais pessoas ganharem grana e quanto mais todos os paises se desenvolverem, mais mercado(dinheiro circulando) teremos para todo mundo. enfim o problema não e como é mostrado a mensagem, mas sim a mensagem em si que é a união européia sendo atacada pelos BRICS, não têm como uma propaganda dessa não ser racista, eles podiam ter colocado ela de qualquer forma, se a mensagem for vamos nos unir porque os BRICS querem nos atacar ela ainda é uma propaganda racista e estereotipada.

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